quarta-feira, 6 de agosto de 2014
QUEM ME DERA QUE A MINHA VIDA FOSSE UM CARRO DE BOIS - Alberto Caeiro(F. Pessoa)
QUEM ME DERA QUE A MINHA VIDA FOSSE UM CARRO DE BOIS
Quem me dera que a minha vida fosse um carro de bois
Que vem a chiar, manhaninha cedo, pela estrada,
E que para de onde veio volta depois
Quase à noitinha pela mesma estrada.
Eu não tinha que ter esperanças — tinha só que ter rodas...
A minha velhice não tinha rugas nem cabelo branco...
Quando eu já não servia, tiravam-me as rodas
E eu ficava virado e partido no fundo de um barranco.
Ou então faziam de mim qualquer coisa diferente
E eu não sabia nada do que de mim faziam...
Mas eu não sou um carro, sou diferente
Mas em que sou realmente diferente nunca me diriam.
© ALBERTO CAEIRO
4-3-1914
In O Guardador de Rebanhos. Poemas Completos de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa, 1994
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